Em texto anterior falei-vos da presença na Kymco Premium Experience e apresentei a AK550 Premium. Agora é a vez de olharmos para a CV3, a segunda – e mais marcante – proposta da marca de Taiwan para o seu segmento Premium. E a distinção é logo evidente: a CV3 tem 2 rodas no eixo dianteiro.
A forte aposta da Kymco no que designou por segmento Premium está vincada no desenvolvimento desta CV3 e da ambição que a caracteriza. Os números das primeiras vendas nos mercados onde já está a ser comercializada são animadores e provam a valia desta aposta.
A CV3 tem que ser analisada segundo duas perspectivas em paralelo:
– em primeiro lugar, as características fundamentais que deve ter para ser considerada uma proposta de prestígio, leia-se Premium no léxico da marca;
– em segundo lugar, a especificidade da sua configuração de 3 rodas.
UMA APOSTA SOFISTICADA
Existem características obrigatórias que qualquer produto deve ter se se quiser posicionar no topo da escala de valores, chame-se ele “Prestige”, “Gold”, “Privilege”, “High” ou qualquer outra designação (a utilização de estrangeirismos é aqui habitual…).
A Kymco escolheu “Premium” e ficou obrigada a cumprir esse caderno de encargos: induzir confiança, demonstrar qualidade, ter design distintivo, ser sofisticada. Por seu lado, o Cliente ao qual se destina está disposto a pagar mais pelo privilégio de ter algo que o distingue da vulgaridade.
O projecto da CV3 decorreu em simultâneo com a AK550, aproveitando as sinergias daí decorrentes. O posicionamento estratégico de ambas é semelhante, tal como a maioria dos componentes mecânicos e electrónicos (exceptuando aqueles que são característicos da configuração de cada um).
Passemos à análise, com duas notas prévias:
1ª – queiramos ou não, o olhar vai sempre concentrar-se na parte da frente da CV3. As duas rodas no trem dianteiro ainda não são uma solução banal, a volumetria que induzem dá um aspecto mais massivo à frente da moto e, last but not the least, as jantes dianteiras totalmente visíveis são francamente bonitas!
2ª – é inevitável que ao apreciarmos a CV3 não façamos algumas comparações com a sua irmã AK550 Premium. Até para percebermos como partindo de uma base comum, a Kymco fez interpretações diferentes do seu conceito.
APRECIEMOS A MÁQUINA
Como disse, a frente prende-nos o olhar. Por isso deixarei essa parte para depois e começo pela traseira da moto. A assinatura digital das luzes traseiras é mais minimalista que a da AK550. Mais clássica se assim quisermos. E desde logo fica também evidente a diferente estrutura do banco. Que está dividido entre condutor e passageiro, cada um com apoio lombar para maior conforto. Acresce que o apoio do condutor é regulável em 3 posições. As pegas são de menores dimensões mas permitem a colocação no próprio quadro (que está à mostra, é em alumínio e tem um excelente aspecto) de acessórios, como sejam as malas laterais. Não há dúvidas! Esta é uma moto destinada a viajar. Acresce a possibilidade de retirar o banco traseiro e no seu lugar colocar uma top-case, mantendo uma correcta distribuição de pesos. Debaixo do banco do condutor existe um espaço capaz de transportar um capacete integral. Não é muito folgado e temos dúvidas se calotas mais avantajadas (como as dos modulares) lá conseguirão caber. Este espaço é iluminado e dotado de uma tomada de 12V.
O motor – bicilíndrico de 550cc – está colocado em posição central e rebaixada. Tal contribui para baixar o centro de gravidade, aumentar a estabilidade e garantir uma distribuição de pesos equilibrada – 50% / 50% entre a frente e a traseira. O escape situado à direita está perfeitamente enquadrado nas linhas da moto e produz um agradável som grave: mostra que está lá sem ser intrusivo.
Chegamos à metade dianteira onde tudo é diferente. Tudo? Não, porque a nível de equipamento esta CV3 está ao nível da AK550. O que é significativo. Apenas notámos a ausência da regulação eléctrica do vidro dianteiro (substituída pela possibilidade de afinação em duas posições alternativas afastadas 4 cm, com recurso a ferramenta) e o desaparecimento do porta luvas com a possibilidade de carregamento de telemóvel por USB.
Ou seja, existem:
– 3 níveis de aquecimento dos punhos, com comando no punho esquerdo e indicador no ecrã
– 2 modos de condução: Normal e Chuva (Power/Rain). O comando está no punho esquerdo e os 2 modos representam a aplicação de mapas de injecção diferentes: a potência reduz-se de 51,7 para 43,6 cv (e o binário de 52 para 47 Nm)
– Sistema sem chave – Keyless One Touch – actua via simples toque no botão central. O sistema detecta o controle remoto até um limite de 3,5m de afastamento
– Cruise control operacional entre os 45 e os 130 km/h, instantaneamente desactivado pressionando o botão no punho esquerdo ou accionando os travões
O olhar penetrante das ópticas dianteiras, em LED e com uma assinatura luminosa marcante, definem a “personalidade” desta máquina. Para o que também contribuem as linhas angulosas da carenagem e a sua boa protecção aerodinâmica. E chegámos ao principal: o trem dianteiro.
CV3 – 3 RODAS PARA SEGURANÇA (KYMCO DIXIT)
É evidente que termos 3 pontos de contacto com o solo sugere maior segurança. Desde logo porque se a moto estiver imobilizada, nem sequer necessitamos de colocar os pés no chão. Mas, em andamento, a própria dinâmica do movimento e a necessidade de manter sempre as 3 rodas coladas à estrada, em contrapeso às forças centrifuga e centripeta que geralmente são compensadas com a inclinação da moto e do motociclista, levantam questões que requerem soluções sofisticadas. A Kymco desenvolveu o KALS – Kymco Advance Leaning Suspension – que segundo a marca assegura melhor estabilidade em curva e uma condução mais facilitada em diferentes condições de piso. Ao mesmo tempo, o maior ângulo de viragem permitido traduz-se numa experiência de condução superior, comparando com os principais concorrentes. O sistema, com 2 rodas de 13”, tem um eixo dianteiro basculante ao qual estão associadas duplas forquilhas em cada roda.
Ou seja, um sistema com 4 amortecedores. As muitas vantagens anunciadas são:
– menor sensação de peso
– melhor distribuição de pesos
– mais confortável com rodas de 13”
– sistema sem manutenção
– grande estabilidade em inclinação
– manutenção da trajectória em travagem
– maior agilidade a baixa velocidade
– guiador montado em silent blocks para redução das vibrações
Dois outros componentes específicos desta CV3 são:
– Sistema de travagem BOSCH 9.1 ABS (de acordo com a homologação L5e). O travão direito acciona os travões dianteiros, o esquerdo o traseiro e o pedal situado do lado direito acciona todo o sistema. O travão de estacionamento situado do lado esquerdo do guiador activa um dos pistões do travão traseiro. As mantes são reguláveis em 4 posições. A existência do pedal de travão faz com que esta moto possa ser conduzida com carta de condução de automóvel!
– Sistema Eléctrico de Tranca de Inclinação, accionável através de interruptor no punho direito (ao alcance do polegar direito) tranca a função de inclinação. Actua abaixo de 13 km/h e com rotação abaixo de 2.000rpm. Destranca automaticamente acelerando acima de 2km/h e rotação acima de 2.200rpm. Permite a paragem sem necessidade de colocar os pés no chão.
EM ANDAMENTO
Como diria Fernando Pessoa, “primeiro estranha-se, depois entranha-se”. Confesso que não cheguei integralmente à segunda fase…
Todavia, desde logo se torna fácil reconhecer que para um condutor menos experiente (por exemplo, quem evolui do automóvel e chega ao mundo das motos) ou cuja auto-confiança nas suas capacidades de equilíbrio é menor, esta solução é uma excelente alternativa. E se o pode fazer com classe e um bom nível de sofisticação tecnológica… tem aqui uma solução óbvia.
Para a minha envergadura (1,82m de altura) não me senti tão à vontade como com a AK550 Premium. Ficou a sensação que estava sentado mais próximo do guiador, logo obrigando a uma posição mais direita, e com menos espaço para as pernas (até porque à direita está colocado o pedal de travão). Acresce que o útil encosto lombar reduz o “espaço de manobra”, impossibilitando qualquer tentativa de nos esticarmos…
Se com a AK tinha algumas reservas face à relação peso/potência, aqui elas eram ainda maiores: a CV3 pesa (a seco) 265kg! Mas tal como referi no ensaio da AK, o motor não nos deixa ficar mal. É evidente que não tem a ligeireza de uma qualquer scooter 125, mas compensa com um motor cheio em baixas e médias rotações, permitindo recuperações de bom nível, enquanto em autoestrada conseguimos manter ritmos capazes de garantirmos uma boa imagem – e dispendiosa – nas fotos…
Mas é nas curvas que tudo acontece! A CV3 permite inclinações dignas de um qualquer Marquez (e sem ir ao tapete) em perfeita segurança e com níveis de diversão e adrenalina absolutamente incríveis. É preciso irmo-nos habituando porque os limites estão muito para lá do que os nossos instintos estão habituados.
Não há bela sem senão. Apesar de a marca anunciar uma divisão de massas de 50/50 e de garantir que o sistema adoptado no eixo dianteiro garante maior leveza, nunca deixamos de sentir que a frente é mais pesada que a de uma moto dita normal – e é mais pesada, obviamente – além de termos a sensação que é necessário “puxar” a moto para a curva.
Não é um movimento fluído como estamos habituados mas sim, necessitamos “comunicar” à moto que é por ali o caminho. Pequeno preço a pagar pelo elevado nível de diversão proporcionado, quando estamos no apex da curva e percebemos que a estrada está logo ali… e em segurança.
Outro aspecto que julgo merecer atenção do potencial condutor, as leis da física são o que são. E a um maior peso corresponde uma maior inércia. E isso impacta nas distâncias de travagem. Obviamente que o sofisticado sistema de travagem faz o seu papel. Está lá para isso!
Finalmente, as suspensões: garantem uma conforto muito elevado em condução desde que o piso esteja em razoáveis ou boas condições. Quando o asfalto se degrada ou enfrentamos os empedrados irregulares das nossas estradas, o menor curso (não será alheia a configuração, com 4 amortecedores a trabalharem em conjunto) reflete-se em maior rigidez, algum desconforto e num crescendo de vibrações no guiador.
Por falar em guiador, tal como na AK, accionar o travão de estacionamento resulta numa buzinadela… até estar habituado!
Ao contrário, quando paramos num semáforo por exemplo, o simples toque no botão que está no punho direito e que bloqueia o sistema de inclinação, faz com que fiquemos confortavelmente instalados à espera do “verde” sem precisarmos de colocar os pés no chão.
EM CONCLUSÃO
Toda a experiência de condução de uma scooter com 3 rodas é completamente diferente. O comportamento é específico, as rotinas têm que ser adaptadas e novas surgem, tem vantagens e também tem desvantagens. Muitas delas já referidas atrás.
Não tenho dúvidas que esta pode ser uma excelente companhia em viagens cujo limite estará muito para lá do trajecto diário ou de fim de semana. Com conforto e uma agradabilidade de condução que proporciona a segurança e confiança necessária a enfrentar distâncias mais longas.
Já em ambiente citadino, faltar-lhe-á alguma agilidade (principalmente se o objectivo for andar a “furar” as filas de trânsito) mas irá cumprir, sem dúvida. E a tal facilidade de paragem sem os pezinhos no chão é uma boa ajuda…
A Kymco CV3 é uma moto (leia-se scooter) muito sofisticada. Quer em termos tecnológicos pela sua especificidade de 3 rodas quer pelo amplo pacote de equipamento, como também pelo seu aspecto. Tem classe, não passa despercebida mas não é ostentatória. É Premium. A Kymco está de parabéns porque neste domínio atingiu o seu objectivo.
Não é dispiciendo a forma como esta scooter é vista legalmente em termos de acesso: é possível conduzi-la com a carta de automóvel ligeiro – a vulgar classe B. Cortesia do pedal de travão…
Se os potenciais interessados concordarem, será mais fácil desembolsarem os cerca de 13 mil euros necessários para levarem uma para casa. Com a certeza que os amigos e os vizinhos vão dar por isso… com inveja?
KYMCO CV3
MOTOR bicilíndrico, refrigeração líquida
CILINDRADA 550 cc
POTÊNCIA 50,2 cv @ 7.500 rpm
BINÁRIO 52 Nm @5.750 rpm
CAIXA automática – CVT
QUADRO tubular em aço
DEPÓSITO 15,5 litros
SUSPENSÃO DIANTEIRA duas duplas forquilhas telescópicas
SUSPENSÃO TRASEIRA monoamortecedor
TRAVÃO DIANTEIRO 2 discos de 270 mm
TRAVÃO TRASEIRO disco de 260 mm
PNEU DIANTEIRO 2 x 110/70-13
PNEU TRASEIRO 160/60-15
DISTÂNCIA ENTRE EIXOS 1.580 mm
ALTURA DO ASSENTO 795 mm
PESO 282 kg
P.V.P. (desde) 12.990 €